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  • Foto do escritorLilian Primi

Por que um diário de pesquisa


Sempre gostei de escrever e quando criança, amava os diários. Não pelo caráter secreto do relato, no entanto. O que me atraía era escrever todo dia. Este exercício, que depois se tornou parte da minha profissão, é a única forma que encontrei para organizar o pensamento e, então, acalmar a alma. Muitas vezes me vi incapaz de dizer o que me ocupava a mente, de forma articulada e minimamente compreensível. Talvez venha daí o hábito, que é um patrimônio da família Primi, como diz minha cunhada, de usar "coisa" para substituir termos, nomes ou variáveis que me escapam no meio da conversação. Minha resposta à cunhada é que este "é o nosso jeitinho de fomentar o pensamento lógico do interlocutor", que vai precisar fazer um exercício de lógica para compreender o que estou falando. Nunca houve quem não entendesse.

Este diário que se inicia hoje tem por objetivo organizar a tsunami de informações que venho reunindo desde 2013, quando ingressei no mestrado, sem muita metodologia. A ideia é manter um repositório de dados contextualizados e devidamente creditados, nucleares aos conteúdos das referências bibliográficas, e que em muitas ocasiões me levaram a viagens imaginárias fantásticas. Praticamente inúteis, porém. A escolha da imagem para o logo - uma gravura do periódico O Brasil Ilustrado, lançado em 1887 no Rio de Janeiro * - é uma referência à essa criatividade falsamente inútil. Trata-se de uma das muitas publicações ilustradas que surgiram no final do século 19 no Brasil e que tem como subtitulo "arquivo de conhecimentos úteis". Na definição dos seus criadores,

"...um modesto arquivo de conhecimentos úteis, isto é: consagrado à boa lição de tudo quanto pode instruir recreando, especialmente em relação às coisas pátrias, à história, geografia, uso, costumes, flora, fauna, paisagem e obras de arte do Brasil, como esboça este primeiro número". (FERREIRA, Félix. Brasil Ilustrado, Rio de Janeiro, n. 1, p. 3, 1887)

Tania Regina de Luca, que analisa e nos traz as gravuras* deste periódico no artigo O Brasil Ilustrado (1877-1878) e Félix Ferreira: Conhecimentos úteis em prol da Nação, (Revista de História (São Paulo), núm. 179, a07918, USP- 2020) explica que foi impossível definir com exatidão a data de início, periodicidade, preço de capa e fim desta publicação, que era encadernada depois na forma de livro. Este tipo de publicação resistiu até bem pouco tempo, sob o nome de fascículos. Coleções com temas determinados, formato que serviu para a publicação desde grandes enciclopédias (a Conhecer, da Abril, por exemplo) até coleções de revistas infantis (Recreio, também da Abril) e os mais variados manuais. A Editora Três era fértil em fascículos, de variados assuntos e funções. Cheguei a escrever para alguns deles, principalmente nos fascículos sobre criação de peixes em aquário. Nos anos de 1990, já em franca decadência mesmo antes do aparecimento do Google, foram usados pelos grandes jornais para alavancar a venda das edições de domingo: vinham encadernados junto com o jornal, como brinde.

No século 19, os assinantes os entregavam aos editores, que juntavam os fascículos e descartavam as páginas iniciais, onde constavam essas informações. Este diário, da mesma forma, provavelmente não terá atualizações todo dia, como diz o título, pelo que desde já me desculpo. Mas garanto que será um registro fiel e digno dos esforços e do caminho que sigo nesta empreitada, a de entender o mundo em que vivo.


*Brasil Ilustrado, vinheta que identificava a seção Belas Artes (Brasil Ilustrado, n. 1, p. 7, 1887) (no alto da página).

NA GALERIA ABAIXO: reprodução da capa do invólucro do segundo número do Brasil Ilustrado (Brasil Ilustrado, n. 2, 1887, invólucro não numerado). primeira página do número inaugural do Brasil Ilustrado (Brasil Ilustrado, n. 1, p. 1, 1887); Ilustração de texto literário com capitular e inserção que ultrapassa os limites tipográficos. Brasil Ilustrado, n. 11, p. 170; Segunda página interna do invólucro do segundo número do Brasil Ilustrado Brasil Ilustrado, n. 2, 1887, invólucro não numerado; Representação cartográfica do Atlântico Sul Brasil Ilustrado, n. 5, p. 69, 1887; stampa relativa a indígenas brasileiros Brasil Ilustrado, n. 10, p. 148, 1887. FONTE: Biblioteca Nacional


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